O acordo assinado anteontem pelo ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni, para se livrar de uma acusação de caixa 2 deve levar a Procuradoria-Geral da República (PGR) a oferecer, a outros suspeitos de crimes eleitorais, o pagamento de multa para deixar de responder a um processo, na avaliação de juristas ouvidos pelo Estadão. Segundo esses analistas, porém, nem todos os réus podem usar o instrumento. Quem é acusado de mais de um crime além de caixa 2, como lavagem de dinheiro ou corrupção, por exemplo, deve ficar de fora.

Onyx reconheceu que recebeu R$ 300 mil em caixa 2 da empresa que controla o grupo JBS nas campanhas de 2012 e 2014 e se comprometeu a pagar multa de R$ 189 mil para encerrar a ação. Como efeito prático, Onyx se livra da possibilidade de virar ficha-suja, caso fosse condenado em segunda instância, o que o impediria de concorrer em eleições por oito anos.

Chamado de acordo de não persecução penal, o dispositivo foi incluído na legislação brasileira ano passado por meio do pacote anticrime. O Ministério Público (MP) pode oferecer o acordo a qualquer réu que não seja reincidente, que tenha sido acusado de um crime sem violência e cuja pena mínima não seja maior do que quatro anos. Segundo o código eleitoral, deixar de declarar uma doação à campanha pode dar de dois a cinco anos de prisão, a depender do caso.

Se o MP atribuir outro crime ao réu, a pena mínima aumentaria e tornaria a realização de um acordo improvável, segundo a advogada Cecilia Mello, desembargadora aposentada do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3). A corrupção, que pode acompanhar uma acusação de caixa 2 caso o réu tenha recebido algo em troca da doação não contabilizada, também prevê pena mínima de dois anos de prisão. Segundo Cecília, a PGR deve fazer acordos semelhantes ao do Onyx para crimes de “menor complexidade e valor não tão estrondoso”.

Segundo Cecília, é possível até que casos que envolvam valores maiores de doações que não foram declaradas à Justiça Eleitoral inviabilizem um acordo. Na opinião dela, os procuradores podem entender que um valor muito alto pode causar ter causado interferência no processo eleitoral.

A advogada constitucionalista Vera Chemim avalia que, como se trata do primeiro acordo feito na seara eleitoral pela PGR, “não há dúvidas de que surgirão outros casos semelhantes que farão a mesma trilha”. Segundo ela, é possível que outros réus pleiteiem o mesmo benefício dado a Onyx. “Imagine uma situação similar à do Onyx onde o Ministério Público fale: Não vou propor acordo para caixa 2 de campanha. Claro que ele vai pleitear e recorrer, mas a avaliação é sempre do Ministério Público”, diz.

Valor

Para Vera, o acordo serve para resolver “de forma objetiva” e rápida uma ação penal. Ainda assim, segundo ela, é importante que o pagamento da multa seja calculado de forma satisfatória a ressarcir o Estado. “O que se questiona do ponto de vista penal é se esse tipo de acordo minimiza o cometimento de um crime relativamente grave desde que o agente devolva os recursos”, afirma.

Uma das dificuldades nesse tipo de acordo é justamente calcular quanto o réu deve pagar para se livrar da acusação, diz Rodrigo DallAcqua, especialista em Direito Penal. “O delito previsto no art. 350 do Código Eleitoral ofende a lisura do processo eleitoral e gera um dano que não se traduz em termos pecuniários. Portanto, o valor recebido pelo político como caixa 2 não é necessariamente o valor do dano”, afirma o advogado. No caso de Onyx, por exemplo, a multa é menor do que o valor do caixa 2. Segundo DallAcqua, o Código Penal estabelece para calcular a multa.

O criminalista André Damiani acrescenta que, ao propor esse tipo de acordo, o promotor leva em conta que o Estado vai deixar de gastar com um processo longo. “O valor da multa (a Onyx) foi livremente negociado entre as partes e, uma vez que estas deram-se por satisfeitas, devemos presumir que estamos diante de um valor justo. Vale lembrar que a PGR, titular da ação penal, no momento de firmar um acordo de não persecução penal deve ter em conta não apenas o montante atualizado da eventual doação ilegal, mas também o alto custo para o erário público que envolve um longo processo penal cujo resultado é incerto.”

O criminalista Diego Henrique destaca que o acordo “consolidou a adoção das soluções consensuais no sistema criminal brasileiro”, cujo objetivo é conferir celeridade à resolução do conflito.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.