Rambo volta à ativa com Stallone se arrastando nas telas
Cotação: ★½
Volta e meia Sylvester Stallone retorna aos cinemas revisitando alguma cria de sucesso. Quando não volta a interpretar o boxeador Rocky Balboa, está na pele do veterano da Guerra do Vietnã John Rambo. Ambos lhe renderam fama e fortuna em Hollywood, especialmente entre os anos 1970 e 1980. Natural que o septuagenário ator, produtor e bissexto diretor não queira desgrudar de suas galinhas dos ovos de ouro. Basta, afinal, uma simples menção ao nome do personagem e a notícia de um novo filme sendo feito para que os olhos de crítica, público e mídia se voltem com curiosidade para saber como ficará o resultado.
Com Rambo: Até o Fim não foi diferente. Um década depois de sua última encarnação, Rambo está de volta. Inicialmente, sossegado, curtindo seus dias de aposentadoria em um rancho isolado no interior do Arizona, onde se diverte construindo armas e túneis. Lá ele tem a companhia de Maria (Adriana Barraza), que cuida da casa, e da sobrinha adolescente Gabriella (Yvette Monreal), que, enquanto aguarda a ida para a faculdade, vive se divertindo com os amigos e mantem a fixação de cruzar a fronteira mexicana para se encontrar com o seu pai biológico e ter as devidas explicações a respeito de seu abandono. Enquanto isso fica remoendo as experiências passadas que afetaram sua vida enquanto se diverte um pouco ajudando voluntariamente aos bombeiros e policiais salvando vidas em perigo durante perigosas tempestades na região.
O que poderia – e até deveria ser – um epitáfio digno de um dos mais marcantes personagens do cinema pop contemporâneo, entretanto, chafurda quando a ação começa e, aos poucos, deturpa a história original daquele ex-militar perturbado pelas lembranças da guerra em uma sociedade em frangalhos, tanto moral quanto economicamente. O Rambo reencarnado agora por Stallone vai à caça da rede chicana que rapta Gabriella e a forçando a trabalhar como prostituta depois que ela acaba levando um novo toco do sujeito que diz ser seu pai. O que vem a seguir é um festival de xenofobia (todos os mexicanos são bandidos), porrada de tudo quanto é tipo (primeiro Rambo apanha à beça, depois vai devolvendo na mesma moeda), um roteiro frouxo (com personagens que surgem prometendo muito e desaparecem rumo ao nada; situações que vão se resolvendo a capa passo posterior do desenvolvimento, sem deixar margem para a construção de uma rede a ser descoberta lá para a frente), um diretor que apresenta o mais do mesmo dos filmes de ação (esta é a segunda experiência de Grunberg na chefia da função, apesar de já ter um currículo extenso como assistente de direção e diretor de segunda unidade) e um protagonista sem qualquer força dramática.
Que Sylvester Stallone sempre foi quase um zero à esquerda na atuação isso não é novidade – basta olhar a relação do Framboesa de Ouro, premiação anual dedicada aos piores do cinema, para vê-lo na condição de recordista masculino de prêmios, com oito vitórias em 22 indicações. Aliás nem seria problema acompanhar a sua performance que permanece monocórdia até mesmo quando sussurra. A questão é que, fisicamente, o Rambo de hoje, aos 73 anos de idade, está todo com o rosto todo deformado por cirurgias plásticas e o corpo bombadaço por anabolizantes. Com a voz sempre arrastada, ele parece um zumbi nas telas, sedento por vingança, sempre pronto para moer quem aparecer pela frente. Ainda mais se for homem e falar espanhol… aí é que não escapa mesmo de levar uma surra. Quando o filme vai se encaminhando para sua parte final, então, o que já havia desandado se torna pior ainda virando uma paródia esquisita de Esqueceram de Mim, com Rambo atraindo o inimigo para o seu território e aprontando seguidas surpresas aos opositores à sua caça.
Em vez de render uma bela homenagem – como fizera de certa forma em Creed, quando Rocky Balboa treinou seu jovem sucessor nos ringues – a “despedida” de Rambo ainda fica bem frustrante até o clipe que precede os créditos finais, quando, junto à música-tema clássica do personagem, surgem fotografias de cenas dos dois primeiros longas com um Stallone vívido, em plena forma física e inserido num ambiente de selva que jamais aparece neste último filme. Então termina, para alívio do espectador, o epitáfio cinematográfico bem aquém do que mereceria o ícone cinematográfico da degradação social dos Estados Unidos do pós-guerra.
Rambo: Até o Fim (Rambo: Last Blood, EUA, 2019). Direção: Adrian Grunberg. Roteiro: Matthew Cirulnik, Sylvester Stallone e Dan Gordon. Com Sylvester Stallone, Paz Vega, Yvette Monreal, Adriana Barraza. Imagem Filmes. 101 minutos. Estreia nos cinemas brasileiros: 19 de setembro.