Pet shop cede imagens para ex de mulher e causa polêmica; ação contraria LGPD
A empresária Gisele Rodriguez afirma que teve a sua intimidade exposta por um pet shop após o estabelecimento disponibilizar imagens da câmera de segurança ao ex-companheiro dela sem autorização. O local fica na esquina da casa de Gisele, no bairro Mercês, em Curitiba, e, segundo ela, a partir das câmeras, é possível ver a entrada da residência onde ela mora. O caso repercutiu nas redes sociais.
De acordo com o relato da moradora, ela descobriu que o ex havia pedido as imagens ao estabelecimento, na terça-feira (3), quando passava pelo local com o filho do casal. Ela e a criança estavam indo ao supermercado e, ao avistar o pai, o menino gritou: “mamãe, o papai!”. Neste instante, Gisele disse que olhou para dentro e visto o homem.
“Eu voltei e olhei para dentro e ele ficou extremamente constrangido e a [atendente] também”,
conta Gisele.
Sem reagir, a mulher seguiu em direção ao supermercado. Na volta, ela contou que decidiu entrar no pet shop para entender o que havia acontecido, já que o ex-companheiro não tem animais de estimação.
Ao questionar a atendente, Gisele diz que recebeu a resposta com surpresa.
“Perguntei para ela dessa forma: ‘eu vi que meu ex estava aqui dentro, aconteceu alguma coisa?’, porque ele não tem cachorro, então ele não tem porque estar ali, sabe? Ai ela disse: ‘olha, eu não tenho nada a ver com o problema de vocês. Ele veio aqui, me pediu as imagens da câmera de segurança, eu cedi para ele. Você não precisa me contar a sua versão, porque ele me contou a dele, você tem a sua, e eu tenho a minha”.
contou Gisele.
O que o homem alegou para conseguir as imagens
Ela disse ainda que o homem teria insinuado para a atendente que a mulher agredia o filho e que, por isso, precisava das imagens. Conforme a empresária, o relacionamento dos dois acabou há três anos e “não era uma relação saudável”. Ela disse que já conseguiu duas medidas protetivas contra o ex.
Ainda conforme a empresária, ela acredita que, em relação ao último incidente, ele tenha sido motivado por uma briga que tiveram no dia 2 deste mês, devido a um suposto novo relacionamento de Gisele.
A mulher registrou boletim de ocorrência na quarta-feira (5) e conseguiu uma nova medida protetiva. Ela afirmou que vai entrar com um processo judicial contra o homem e o pet shop pelo descumprimento da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD).
Versão do pet shop
Em nota, o pet shop informou que o ex-marido de Gisele havia entrado em contato com o estabelecimento através das redes sociais, pedindo para ter acesso as imagens da câmera de segurança, pois ela teria agredido o filho em frente ao apartamento. Ele chegou a enviar um boletim de ocorrência, informando que estava entrando com uma ação para pedir a guarda da criança. Entretanto, era necessário que tivesse as imagens em mãos.
‘Diante a tanto, falei que não tinha tempo e que, se ele quisesse, viesse ver pessoalmente os vídeos”,
informou o pet shop.
Ao ir ao pet shop, o estabelecimento liberou as imagens das câmeras externas, “que filmam somente a rua e não a casa ou privacidade de ninguém”. De acordo com a dona, como já havia feito em outras ocasiões para pessoas que também pediram por um “motivo plausível”.
Ao ir ao local, o pet shop afirma que o homem viu que as câmeras não alcançavam a entrada da residência de Gisele e por isso decidiu ir embora. Porém, neste momento, a ex passou pelo local e o viu. A dona do pet shop afirma ter explicado a Gisele o que o homem havia pedido.
“Ela tentou se justificar, em tom agressivo, ao responder que não queria saber da versão da história dela como não queria saber da versão dele. Ela tirou suas conclusões, achando que eu havia cedido imagens dela, imagens de quem entra e sai do apartamento dela e começou a gravar vídeos de stories no instagram marcando o Bicho Mimado, falando que eu Regina apoiávamos a atitude dele, atribuindo a mim conduta ilegal (na concessão de imagens da rua) e de colaborar com homem agressor de mulheres”,
explicou.
Segundo o pet shop, em seguida a mulher usou as redes sociais para expor o acontecimento, o que gerou uma mobilização contra o estabelecimento. Diante da situação, a dona do pet shop informou que “providências judiciais já estão sendo tomadas”.
O que a lei diz
De acordo com o advogado Felipe Frank, doutor em Direito Civil e mestre em Direito Empresarial, oferecer imagens de câmera de segurança não é proibido por lei, caso haja um motivo claro e contundente para a disponibilização delas. Conforme o jurista explica, a atual Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) abre brechas para determinadas situações. Entretanto, empresas precisam se adequar a ela, pois é rigorosa quando o assunto se trata da defesa da privacidade.
Frank explica que para um estabelecimento oferecer as imagens sem gerar consequências desagradáveis aos envolvidos, é preciso que, primeiramente, o pedido seja feito para a apuração de um acontecimento envolvendo um dano físico ou patrimonial. Caso se trate de uma violência contra criança, por exemplo, é importante que a empresa leve a situação a uma auditoria interna.
Após isso, o ideal é que ocorra uma apuração das imagens pela própria empresa. Se o estabelecimento averiguar que, de fato, as imagens mostram alguma violação dos direitos, ela pode disponibilizar a quem lhe pediu e procurar órgãos responsáveis. Caso não seja identificado, o advogado afirma que não se deve compartilhar. Isso porque, a LGPD não se refere apenas a proteção do dados como nome, CPF ou RG, mas como também a imagem.
Frank diz que tais situações são comuns pela falta de preparação das empresas em se adequar ao que a Legislação exige. O jurista recomenda que primeiramente, as empresas se protejam a partir da consultoria de uma equipe profissional, pois o investimento em tal serviço é menor do que o de uma ação, que pode ser movida pela pessoa violada.
Já a quem pretende fazer o pedido para a disponibilização de imagens, é importante que seja formalizado através de um e-mail, para que haja o registro de que não há intensões maldosas para tal atitude. Para quem se torna vítima do descumprimento da LGPD, o advogado afirma que é possível entrar na Justiça contra o estabelecimento. Se for visto que não há nenhum crime nas cenas registradas, é provável que a vítima seja indenizada.