Toques virtuais
Aos poucos, fui abandonando muitas coisas, ideais vagos.
Projetos que antes eram vívidos, hoje não fazem sentido algum.
Percorri o caminho doloroso do tempo e parei nesta esquina.
Agora, vejo a rua com meus olhos turvos. Envelheci.
Há dor no envelhecimento. Há lamentações na alma.
A música ao longe me chama. Eu vou. Capenga, mas vou.
Ouço o chapinhar dos meus sapatos na calçada molhada.
No ambiente enfumaçado, eu entro e observo o movimento.
Há pessoas vacantes em uma atmosfera pesada, lúgubre.
O tempo deu meia-volta e retornou. Parou em mim.
Neste lugar, eu vejo almas perdidas e outras por se perder.
Cada um aqui dentro está metido em seu próprio mundo.
Telas de umas poucas polegadas segregam pessoas.
Estranho este navegar virtual. Vida à deriva. Abismo?
No ostracismo, a morte chega lenta e perfura primeiro os olhos.
A fumaça não esconde a agonia nem o desamor de cada um.
Não servem aqui o que gosto de beber. Permaneço calado e abstêmio.
Encosto-me a um canto e observo toda a gente estranha. Burburinho.
Sou pássaro exótico nesta sociedade que abomina o toque para além da tela.
Abrem espaço para a solidão e se vangloriam da melancolia.
Foi tarefa pesada abandonar costumes, manias. Abandonei…
É hora de sair e enfrentar a chuva gelada nas costas.
Carros vêm e vão. Ando a passos lentos como se cambaleasse.
A chuva engrossa. Ninguém me espera. Minha boca está seca.
Sinto vontade de entrar em uma espelunca qualquer e ficar.
Não há o que fazer nesses lugares. Pelo menos, não para mim.
Cada um está metido com seu mundo que se resume a toques em telas.
Procuro refazer meu caminho e contar uma história. Mas que história?
Jossan Karsten