O técnico conseguiu tirar o peso do clássico contra o maior rival; anunciou time ‘diferente’; pode colocar reservas ou não; criou escudo até para derrota
Felipão conhece muito bem o ambiente palmeirense.
Sabe que é instável como Felipe Melo.
E que só há uma derrota capaz de implodir o clima, mudar o rumo vitorioso, trazer a cizânia entre dirigentes, treinadores, jogadores, organizadas e torcedores.
Perder para o Corinthians é o pior que pode acontecer durante a temporada.
A rivalidade encobre a racionalidade.
Luiz Felipe Scolari está iniciando seu sexto ano de Palestra Itália, nesta terceira passagem. E tem plena noção que as derrotas para o Corinthians tiraram qualquer argumento para a sobrevivência de Roger Machado, apesar de toda a proteção de Alexandre Machado e de Mauricio Galiotte.
Perder a final do Paulista em plena arena palmeirense, lotada só de torcedores com camisa verde, foi um baque que Roger foi incapaz de superar.
Felipão já esteve na mesma situação de Osmar Loss, com o Palmeiras indo mal e o Corinthians bem. O que ele fez? Incendiou o ambiente palmeirense, transformou uma simples partida em final de campeonato, com os jogadores dando a alma para vencer. Com o triunfo, tudo ficou mais fácil, enquanto a vida do rival se complicou.
E é tudo o que ele teme no próximo domingo.
O Palmeiras nas suas mãos faz uma campanha de recuperação impressionante no Nacional. Está em quinto, com os mesmos pontos do quarto colocado, o Grêmio. A apenas seis pontos do líder São Paulo. Terá pela frente o Atlético Paranaense nesta quarta, no Palestra Itália. E na próxima quarta-feira, dia 12, o Cruzeiro, pela primeira partida da semifinal da Copa do Brasil, também em casa.
Entre esses dois confrontos, há o Corinthians.
Na arena palmeirense, palco da decepção na decisão do Paulista.
Para não entrar em uma semana de pressão exagerada, não pela proximidade do confronto com o Cruzeiro, mas pelo clássico, Scolari decidiu usar a sua velha contradição como escudo.
Anunciou ontem em Chapecó que colocará um time ‘diferente’ contra o Corinthians.
“Estamos disputando o Brasileiro com a intenção de chegar lá na frente, mesmo que às vezes eu altere cinco ou seis posições. Temos jogadores que jogam muito bem. Vamos brigar pelo Brasileiro, sim, mas desde já quero dizer a vocês que, no jogo antes de Copa do Brasil e Libertadores, que são mata-matas, vamos mudar a equipe.
“Vamos jogar com o Corinthians com uma equipe diferente da que vamos jogar contra o Cruzeiro. Minha torcida já sabe e os dirigentes já sabem como é que vamos fazer no Brasileiro, na Copa do Brasil e na Libertadores.”
Felipão é mestre em falar e nada dizer.
Ou seja, a conclusão de que terá uma equipe reserva contra o Corinthians é óbvia. Só que há perguntas óbvias no ar. Por que Diogo Barbosa, Luan e Hyoran forçaram o terceiro amarelo em Chapecó. Por que poupou Dudu, Moisés, Antonio Carlos, Edu Dracena? E mesmo Bruno Henrique só entrou no segundo tempo?
Quando assume um clube, Felipão só dá satisfação a si mesmo. Mesmo dirigentes são surpreendidos por atitudes do treinador. Faz parte de sua personalidade desconfiada. Odeia vazamentos, que treinadores adversários saibam previamente como escalará sua equipe.
O que Felipão fez em Chapecó foi algo repetitivo para quem o acompanha há décadas.
Ele tirou o peso da partida contra o Corinthians.
Principalmente se o pior acontecer e vier uma derrota.
Não influenciará contra o Cruzeiro, porque avisou antes que o time seria ‘diferente’.
Só que ao contrário do que quis demonstrar, Felipão quer porque quer vencer o Corinthians. Se o time conseguir seis pontos em casa, duas vitórias, nos dois próximos jogos em casa, o Palmeiras colará de vez nos líderes. E ganhará um doping energético para o confronto contra o competitivo Cruzeiro montado por Mano Menezes.
Galiotte e Alexandre Mattos dão carta branca ao técnico. Aliás, foi ele quem exigiu que Felipe Melo seguisse jogando, depois do vexame que aprontou na Libertadores contra o Cerro. Quer usar o problemático volante de 35 anos pelo menos até o final do ano. Até porque não tem o que fazer. Depois, em dezembro, não será surpresa se ele for negociado.
A um mês de completar 70 anos, Felipão sabe mexer as peças.
Manipular a imprensa.
Tirar o foco das questões que não interessam.
Como valorizar o clássico que muda o humor no Palestra Itália.
Todos foram avisados que o Palmeiras terá um time ‘diferente’.
Felipão nunca disse que a equipe será integralmente reserva.
Nem mesmo que terá um time misto.
Ou seja, preparou o ânimo de todos para qualquer resultado.
Que treinador teria essa coragem?
E não seria contestado pelos dirigentes, conselheiros, organizadas?
Só Felipão.
Ele conseguiu.
Está completamente livre de efeitos colaterais do clássico.
Mesmo se perder.
Afinal, não avisou uma semana antes que o time será diferente?
Os 36 anos de carreira ensinaram a Felipão.
Principalmente a manipular a imprensa, diretorias e torcedores…