Sérgio Soares comenta polêmica competição
Um assunto polêmico para o futebol brasileiro é, por incrível que pareça, um dos melhores campeonatos de todos os tempos – só clássicos, com grande público, grandes jogos e jogadores de alto nível – mas que a entidade maior do nosso futebol conseguiu estragar no tapetão com manobras jurídicas e com muitas mentiras que geram várias versões sobre o verdadeiro campeão brasileiro daquele ano. Para entender sobre o que gerou a criação da Copa União de 87, precisamos voltar ao ano anterior. O Brasileiro de 86 foi um campeonato que teve nada mais que 80 clubes participando e a exemplo da Copa João Havelange de 2000, também teve um imbróglio jurídico entre Vasco e Joinvile. Essa competição começou em 30 de Agosto de 1986 e terminou somente em 25 de Fevereiro de 1987. Apesar de toda essa desorganização dentro de campo, a competição teve uma semi-final entre Guarani x Atlético Mineiro, e a outra América-RJ x São Paulo, sendo decidido por Guarani e São Paulo que se tornou campeão daquele ano. Após dois empates, a partida foi decidida nos pênaltis e o tricolor foi campeão.
Após essa desorganização, a própria CBF definiu que em 1987 o torneio teria apenas 24 clubes, de acordo com a colocação do campeonato anterior. Porém, era o mês de junho e a CBF, através do seu presidente Nabi Abi Chedid e do seu vice Octávio Pinto Guimarães, anunciou que não tinha dinheiro algum para organizar a competição nacional, o que fez com que os presidentes dos grandes clubes se reunissem e, através do presidente do São Paulo (Carlos Miguel Aidar), criassem uma associação para organizar o campeonato. Assim nasceu o Clube dos 13, representando os maiores clubes dos Brasil (4 do Rio de Janeiro, 4 de São Paulo, 2 de Minas Gerais e 2 do Rio Grande do Sul) e um clube convidado do nordeste, o Bahia. Sem nenhuma força, a CBF apoiou a ideia e fez apenas um pedido: que fosse incluído mais três clubes de outros estados. Assim, foram chamados Goiás, Santa Cruz, na época o maior clube de Pernambuco, e Coritiba, que fora campeão brasileiro recentemente, porém tinha sido o 43º colocado em 86.
Definido os clubes participantes, o Clube dos 13 foi atrás de patrocinadores e conseguiu a Rede Globo, a Varig e a Coca-Cola, que também patrocinou todos os clubes que não tinham patrocínio nas camisas. Sendo assim, somente Flamengo, Corinthians, Palmeiras e Internacional eram clubes que já tinham outro patrocinador, ficando o caso mais engraçado para o Grêmio, que não queria colocar a logo da empresa em vermelho no seu uniforme. Então, pela primeira vez na sua história, a multinacional mudou suas cores e foi estampada na camisa do Grêmio em preto e branco. Na primeira semana de setembro, presidentes de clubes e federações se reuniram no hotel Copacabana Palace e na sede do Flamengo na Gavéa, então definiram o regulamento da competição e definiram que o então presidente do Vasco, Eurico Miranda, como o intermediário entre CBF e Clube dos 13. O Grupo A ficou com: Atlético-MG, Bahia, Botafogo, Corinthians, Flamengo, Grêmio, Palmeiras e Santa Cruz e o Grupo B: Coritiba, Cruzeiro, Fluminense, Goiás, Internacional, Santos, São Paulo e Vasco.
Com a criação da Copa União, vários clubes se rebelaram principalmente os semi-finalistas de 86. Guarani e America-RJ (ignorados pelo Clube dos 13) juntos com Portuguesa e Sport conseguiram o apoio do SBT e conseguiram também o apoio da CBF para realizar essa competição, e queriam que a entidade promovesse um cruzamento entre os campeões de vice de cada divisão. A CBF levou essa ideia ao Clube dos 13, que foi rechaçada imediatamente por todos os clubes que não assinaram nenhum documento e assim seguiu o Campeonato Brasileiro. Ficando a série B chamada pela CBF de módulo Amarelo da seguinte maneira: Grupo A com Guarani, Criciúma, Atlético-Pr, Portuguesa, Inter de Limeira, Rio Branco, Joinvile e Atlético-GO e Grupo B com Sport, Bangu, Vitória, Treze, Náutico, Ceará e CSA.
Vale lembrar que se fosse pelo índice técnico do Campeonato de 1986, a Ponte Preta entraria no lugar do Sport Recife. Pela série A, chamada pela CBF de módulo verde, o Atlético Mineiro fazia uma campanha irretocável, até então, invicto na competição, era dirigido por Tele Santana pegou na semi-final o Flamengo de Zico, Bebeto. Na outra semi-final jogava o Internacional de Taffarel, contra o Cruzeiro. Após ganhar o jogo de ida no Maracanã por 1×0 gol de Bebeto com o maior público da competição 118 mil pessoas, o jogo da volta no Mineirão ficou conhecido como o melhor jogo do ano, vencido pelo Flamengo por 3×2 com um gol antológico do Renato Gaucho carimbando a vaga da equipe carioca para a final, no outro jogo após empate sem gols no beira – rio no jogo de ida o Inter venceu o Cruzeiro no Mineirão na prorrogação com com de Amarildo e passou a final, decidida em 2 jogos o primeiro empate em 1×1 em Porto Alegre para um público de 63 mil pagantes com gols de Bebeto e Amarildo, e a grande final no maracanã no dia 13 de Dezembro de 1987, para um publico de 91 mil pagantes vencida pelo Flamengo por 1×0 gol de Bebeto dando o titulo da competição ao rubro-negro.
A média de público na competição foi de 20 mil pagantes por jogo. Desde então, somente a média de público desse ano é maior que a de 87. A média de gols por jogo foi de 1,77 e o artilheiro da competição foi o São Paulino Muller, com 10 gols.
Dessa equipe saíram 5 campeões mundiais pela seleção Brasileira: O reserva Aldair, os laterais Jorginho e Leonardo, Zinho e Bebeto, foram a Copa de 1990 o goleiro Zé Carlos. Renato Gaúcho, Leandro, Zico e Edinho foram às Copas de 82 e 86. Da equipe vice-campeã, dirigida pelo experiente e vencedor técnico Enio Andrade, tinha o goleiro Taffarel, campeão mundial que disputaria 3 Copas do Mundo, tinha ainda o lateral Luis Carlos Winck e o zagueiro Aloísio, que disputaram as Olimpíadas de Seul 1988, medalhistas de prata com a seleção. O São Paulo, campeão em 86, tinha um esquadrão com o goleiro Gilmar, o zagueiro Daryo Pereira, os meias Silas, Pita e Neto e o veloz Muller no ataque. A equipe terminou a competição em sexto lugar. Outra equipe que tinha um grande elenco era o Vasco com o goleiro Acácio, o lateral Paulo Roberto, o meia Geovani, Romário e Dinamite, mas terminou a competição em décimo lugar. A decepção do torneio ficou por conta do Corinthians, último colocado na classificação geral .
Pela série B da Copa União chegaram às semi-finais Atlético-Pr x Guarani. No primeiro jogo, 0x0 no Couto Pereira, e em Campinas, no Brinco de Ouro, 1×0 para o Guarani. Gol do meia Marco Antônio Boiadeiro, dando a classificação a final para o Guarani. No outro lado, Bangu x Sport. O Bangu venceu por 3×2 o jogo de ida em Moça Bonita, mas perdeu na Ilha do Retiro, por 3×1, saindo classificado o Sport para a final. Sem interesse da mídia com o campeonato sendo pouco prestigiado pelo público, Sport e Guarani jogaram as finais nas mesmas datas em que Inter e Flamengo jogavam a Série A. No primeiro jogo disputado em Campinas, para apenas 2.450 pagantes, o Guarani venceu por 2×0 com gols do centro avante Evair. No jogo da volta, na Ilha do Retiro, com 16.600 pagantes, o Sport deu o troco e venceu por 3×0, o que forçou a decisão a ir para os pênaltis e, após os 11 jogadores de cada equipe cobrarem a partida terminou empatada, no primeiro momento decidiram dividir o título em campo.
Quando a fase decisiva da Copa União começou, a CBF quis impor um cruzamento entre os campeões e vice do módulo Verde, a série A (Flamengo e Internacional), e do módulo Amarelo, a série B (Sport e Guarani), o que foi rejeitado pelo Clube dos 13, já que o torneio já estava em andamento e não fazia sentido para os grandes clubes esse cruzamento, além de falta de datas para a realização desses jogos. Porém, o interlocutor do Clube dos 13, Eurico Miranda, não tratou o assunto como deveria. Então, a CBF determinou que, sem o cruzamento, os representantes do Brasil na Libertadores seriam Sport e Guarani, e determinou a realização de uma terceira partida entre as equipes para definir quem seria o campeão brasileiro da CBF.
Aí começou a disputa de poder, o que gerou um ridículo W.O entre Flamengo x Sport, e entre Internacional x Guarani, o que fez que no dia 7 de Fevereiro de 88, jogassem, na Ilha do Retiro, para aí sim um público no mínimo descente (26 mil pagantes). O jogo final entre Sport 1×0 Guarani, gol do zagueiro Marco Antonio, o Sport era dirigido por Jair Picerni, aquele mesmo que se destacou no São Caetano anos depois e desse time do Sport, o maior destaque foi o meia Ribamar, comprado no ano seguinte pelo Corinthians, mas que não fez nenhum sucesso e ganhou notoriedade porque depois foi trocado pelo meia Neto, então no Palmeiras, que se tornaria ídolo da Fiel Corinthiana.
Nessa confusão, o então CND (Conselho Nacional de Desportos), criado por Getúlio Vargas, que servia para regulamentar os esportes de competição no Brasil e que foi extinto em 1993, declarou o Flamengo Campeão Brasileiro de 1987. A CBF, que não tinha condições meses antes de organizar a competição, declarou o Sport como campeão. Anos mais tarde, isso se tornou uma batalha jurídica entre os clubes, sendo na justiça Federal o Sport declarado como campeão brasileiro. Anos mais tarde, em 2010, a CBF declarou também o Flamengo Campeão Brasileiro, mas o Sport novamente ganhou na justiça o direito de se autonominar o campeão daquele ano. O que se pode dizer que na competição de alto nível técnico com os maiores clubes dentro de campo, o Flamengo foi o legítimo campeão e, nos tribunais, o Sport agora é só analisar os times acima dos campeonatos e tirar a conclusão qual competição teve realmente um valor técnico e esportivo.
A única coisa sem razão dos cariocas é se achar no direito de ter a taça das bolinhas de forma definitiva (quem ganhasse 5 vezes o Brasileiro ficaria com a taça original), já que o troféu daquele ano foi oferecido pela revista placar. Uma linda taça, que o jornalista Juca Kfouri entregou para Zico na sua despedida no Maracanã, em Fevereiro de 1990, como ele disse: “A Copa União era para ser um marco para o futebol brasileiro, mas os cartolas não se entenderam e foram corrompidos pela CBF. Então, fica para você como símbolo de tudo o que fez pelo futebol”, hoje se encontra no museu do Zico no CFZ, Rio de Janeiro.
A Copa União foi a primeira vez em que os clubes se rebelaram contra a CBF. Meses antes, São Paulo e Flamengo não cederam seus jogadores para a Seleção que iria fazer alguns amistosos na Europa. Conseguiram organizar um campeonato que foi sucesso em todos os aspectos, técnico de público e audiência e também financeiramente. Mostraram sua força, mas não conseguiram manter isso por muito tempo. Anos mais tarde, em 1989, os clubes ingleses fizeram o mesmo contra a Federação Inglesa e criaram o campeonato de maior sucesso do mundo atualmente: a Premier League. Ou seja, poderíamos estar a frente de tudo o que envolve as grandes ligas. Desde então, o campeonato Brasileiro teve várias formulas e regulamentos. Não podemos esquecer que a CBF promoveu campeonatos com regulamentos esdrúxulos como em 1993, as viradas de mesa de 1995, 1996 e a Copa João Havelange em 2000 e vários escândalos que cercam a entidade, tanto políticos quanto de corrupção. Desde 2003 o Campeonato Brasileiro passou a ser disputado com a fórmula de pontos corridos, porém o calendário ainda precisa ser melhorado e muito.