Voto impresso auditável. Por que não?
O Brasil vive tempos de polarização extrema no atual cenário político. As opiniões que circundam o tema são, em geral, pouco aprofundadas. E isso implica em diversos problemas. A informação de qualidade e sem amarras ideológicas, por vezes, fica em segundo plano. E são muitos os exemplos. Mas o destaque, nestes últimos dias, não poderia ser outro: A PEC do voto impresso auditável – ainda em discussão no Congresso – mais uma vez, perde espaço para o sensacionalismo.
Na próxima quinta-feira (5), a Proposta de Emenda Constitucional, de autoria da Deputada Federal do Rio de Janeiro, Bia Kicis, e que tem como relator o Deputado Federal paranaense Felipe Barros, vai ser analisada, desta vez, por uma comissão especial da Câmara dos Deputados. Para ser aprovado, o documento precisa de maioria simples entre os 34 membros. Caso isso ocorra, a expectativa é que siga para análise e votação em plenário ainda no mês de agosto. Como se trata de emenda à Constituição, é necessário que haja duas votações tanto na Câmara quanto no Senado e voto favorável de, ao menos, três quintos dos parlamentares.
Mas, antes de entrar no mérito da proposta, a pergunta que muitos ainda fazem é se voltaremos a utilizar a cédula impressa para o registro de voto nos pleitos municipais, estaduais e federais. Puro retrocesso, não? Para aqueles que se lembram do sistema eleitoral do fim do século XX, vem à tona a dificuldade na apuração dos votos. Mas a razão desta PEC passa bem longe disso.
Caso aprovada pelo Congresso, o processo eleitoral vai funcionar assim: Após a pessoa concluir o voto na urna eletrônica, uma cédula seria impressa automaticamente, contando se o número em que ele votou na urna bate com o que foi impresso. Esta cédula, ao ser impressa, iria para uma caixa de acrílico. A ideia é que, em caso de acusação de fraude no sistema eletrônico, os votos em papel possam ser apurados manualmente.
É como se fosse feita uma verificação em duas etapas. Teríamos, assim, a implementação de uma camada extra de transparência. Entendo que proposta pode garantir isonomia e mais confiabilidade ao sistema eleitoral. E se é mais uma garantia, por que não apoiar o voto impresso auditável?
Discussões em torno da inclusão da impressão do voto no ordenamento jurídico brasileiro pairam pelos ares do Planalto Central há quase duas décadas. Mas nunca avançaram. E por alguns motivos. Entre eles, a Lei nº10.740, que instituiu o chamado Registro Digital do Voto – o RDV -, tem sido o principal subterfúgio utilizado para a não impressão do voto, mesmo diante dos riscos de violações do software operado pelas urnas eletrônicas brasileiras.
Com esta nova proposta, este cenário pode mudar. Se ambos os registros devem conter os mesmos dados, não há motivos para alegar que o conteúdo do material impresso pode ameaçar o sigilo do voto. Até mesmo porque o conteúdo vai ficar sob total domínio do TSE.
Outro discurso que atrapalha o desenrolar desta proposta envolve custos. Para alguns, os gastos foram estimados na casa dos R$ 2 bilhões para adaptação das urnas eletrônicas. Para outros, os valores seriam bem inferiores. Independentemente desta discussão, é correto afirmar que, sim, temos dinheiro para isso. Por que não abrir mão de parte do fundão, por exemplo, e investir na segurança do sistema eleitoral brasileiro?
A grande questão é que esta discussão vai muito além de registrar, ou não, votos em cédulas. Envolve, acima de tudo, a confiabilidade das eleições. Não são poucos os especialistas políticos que afirmam que o resultado de qualquer disputa democrática só pode ser levado em consideração caso todos os envolvidos confiem totalmente na regra do jogo. Por isso, vem a importância da maturidade em analisar pautas como esta.
Acredito que a desinformação é o que mais atrapalha o caminho que precisamos trilhar. Preocupa-me a polarização extrema que existe acerca dos projetos discutidos nas Câmaras Municipais, nas Assembleias Legislativas e no Congresso. Antes do conteúdo, as pessoas analisam se é uma bandeira de esquerda ou direita, quando o certo seria ter todas as informações necessárias antes de tomar e defender uma posição.
Agora, é hora de acompanharmos as decisões tomadas pelos nossos deputados e senadores a respeito da PEC do voto impresso auditável. Por que não acolher uma demanda que surge de parte da população brasileira? As diversas manifestações registradas nos quatro cantos do país precisam ser vistas pelos representantes do executivo, do legislativo e do judiciário. Afinal de contas, é um clamor por mais transparência, confiabilidade e legitimidade do sistema eleitoral brasileiro. Por que não?