A volta dos trabalhadores nas obras do Gaslub (ex-Comperj) em Itaboraí, município do Rio de Janeiro, multiplicou a contaminação de covid-19 entre os empregados das empresas contratadas pela Petrobras, segundo representantes de sindicatos e da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (Cipa) do local. De acordo com os trabalhadores, a testagem rápida e a medição de temperatura têm sido insuficientes para conter a disseminação do vírus e as baixas têm sido constantes.
Falando sob anonimato para evitar retaliações das empresas, trabalhadores contratados por empreiteiras para a obra acusam a petroleira de deixar na mão das terceirizadas o controle da disseminação do vírus, determinando apenas diretrizes de combate à pandemia, e quando atua faz testes rápidos quinzenais para detectar a doença, uma prevenção considerada inócua por infectologistas.
Segundo os trabalhadores, os testes rápidos não estão dando resultado para conter o vírus, já que apenas os empregados que apresentam anticorpos IGM positivos estão sendo postos em quarentena, deixando no local de trabalho os que possuem IGG positivo, o que contraria as orientações científicas, segundo os trabalhadores.
IG é a sigla para imunoglobulina, um tipo de anticorpo produzido pelo sistema imunológico contra um agente invasor. No caso do teste identificar a presença do anticorpo IGM, o paciente está ou esteve infectado recentemente e o corpo ainda luta contra a infecção, e é posto em quarentena. Já se o reagente for o IGG, o paciente já teve a infecção e possivelmente está imunizado. Na avaliação dos trabalhadores, todos que tiveram alguma reação deveriam ser afastados, assim como os trabalhadores que tiveram contato com a pessoa infectada.
Na obra trabalhavam cerca de seis mil pessoas antes da pandemia. Em março, houve redução para 35% desse total. Em maio, as empresas contratadas elevaram esse efetivo para 75% e em junho, segundo os trabalhadores, 100% da equipe teria retomado os trabalhos, o que foi negado pela Petrobras. Segundo a companhia, atualmente 35% dos funcionários continuam fora da obra, ou 2.100 pessoas.
Segundo as fontes, mais de 300 trabalhadores já testaram positivo na obra, e a cada testagem um número maior de pessoas se revela com o vírus. Já seriam seis os óbitos por covid-19 no Gaslub, segundo os sindicalistas e representantes da Cipa ouvidos pelo Broadcast, o que não é confirmado pela Petrobras, que afirmou não comentar o assunto. Procuradas, as empreiteiras que trabalham no Gaslub também não responderam à reportagem.
“A Petrobras tem compromisso com o cuidado e a proteção dos colaboradores, incluindo seus familiares e pessoas próximas. Por isso a companhia não vai informar quando algum colaborador tiver confirmação ou complicações decorrentes da covid-19. A companhia entende que, em linha com nosso valor de respeito às pessoas, a garantia da privacidade e do sigilo se sobrepõe nessas situações”, disse a Petrobras em resposta ao Broadcast, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado.
A estatal afirmou que desde o início da pandemia de covid-19 tem adotado medidas de proteção a todos os empregados e terceirizados para reduzir a propagação do vírus. A empresa disse que já realizou quatro mil testes rápidos no Gaslub e que continuará testando os empregados para garantir o retorno gradual ao trabalho na obra.
O Gaslub substituiu o Comperj, que seria um grande complexo petroquímico ligado à produção de gás natural do pré-sal. O projeto, administrado pelo ex-diretor de Abastecimento, Paulo Roberto Costa, afundou junto com a Operação Lava Jato, que investigava a corrupção dentro da Petrobras. Agora, o batizado de Gaslub, o local vai abrigar o gasoduto conhecido como Rota 3, para escoamento do gás do pré-sal, e uma unidade de processamento desse gás (UPGN), com capacidade para 21 milhões de metros cúbicos diários.
“A Petrobras reforça que as medidas preventivas adotadas em suas unidades – entre elas monitoramento da saúde antes do embarque ou início do turno; canais de comunicação e orientação para colaboradores; testagem de colaboradores com suspeita ou para triagem – são extensivas aos colaboradores de empresas prestadoras de serviços com a finalidade de reduzir a propagação do vírus nas unidades”, informou a estatal.
No canteiro de obras, a Petrobras informa ainda que outros cuidados foram tomados, como rotas de transporte pré-estabelecidas para o local evitando contato, mudança nos turnos de horários de alimentação para evitar aglomeração, reforço em medidas de higienização nos locais, uso obrigatório de máscara, disponibilização de álcool em gel e instalação de pias para higienização das mãos dos colaboradores.
Mesmo com todos esses cuidados, a Petrobras lidera, em número de empregados contaminados, a lista de empresas ligadas ao Ministério de Minas e Energia (MME). Segundo o ministério, dos 46.416 empregados próprios da empresa, 1.547 foram contaminados pela covid-19, sendo que 1.333 já estão recuperados. O Ministério Público do Trabalho tem acompanhado a evolução dos casos, mas diante de divergências nos dados informados, vem estudando como proceder junto à estatal.
“A Petrobras parou de informar o histórico de contaminação e passou a informar apenas os casos ativos da doença. Então fica difícil saber exatamente quantos casos de covid temos”, explicou a procuradora Flávia Bauler ao Broadcast, informando que a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e outra procuradora do MPT estão analisando medidas cabíveis para obter os números corretos.